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Ucrânia

Chernobyl Hoje: Como é a visita à área do acidente nuclear na Ucrânia [+Infográfico]

Como visitar Chernobyl: A Piscina Pública Lazurny, vazia e abandonada, com seus azulejos descascados e pichados. O trampolim na ponta com duas alturas diferentes. O teto danificado, as janelas quebradas, com a mata adentrando o espaço

Visitar Chernobyl foi o ponto mais alto de nossa viagem pela Ucrânia e um dos lugares mais marcantes que já visitamos em nossas vidas. Foi bastante difícil planejar também, pois as informações sobre os tours que vão até lá são praticamente inexistentes em língua portuguesa. Ainda são poucos os turistas que têm coragem de ir até Chernobyl, mas podemos garantir: é um tour bastante seguro se for feito da forma certa e com empresas sérias. Neste post iremos contar como visitar Chernobyl é mais simples e seguro do que muita gente pensa.

O acidente nuclear de Chernobyl

Como visitar Chernobyl: O reator 4 ao fundo e o rio em primeiro plano
O sarcófago do reator 4, que explodiu, ao fundo

A Ucrânia era parte da União Soviética e só se tornou independente depois da queda do bloco socialista, em 1989. Em seu território ficava o complexo de reatores da usina nuclear mais importante do país, chamada V.I. Lenin, que ficou internacionalmente conhecida como a Usina Nuclear de Chernobyl.

Em 25 de abril de 1986, um dos reatores da usina, o V.I. Lenin IV, estava agendado para participar de um teste de segurança durante a noite. Já na madrugada do dia 26, o exercício que era para ser de rotina deu incrivelmente errado e superaqueceu o reator, contando ainda com a falta de experiência da equipe que estava de plantão no dia. O erro no teste resultou no maior desastre nuclear da história.

O reator pegou fogo e explodiu. Todos que estavam próximos morreram na hora. Os bombeiros que tentaram controlar o incêndio – achando que tinha causa elétrica, apenas – faleceram dias depois, devido à altíssima contaminação a que foram expostos.

Em tempo de Guerra Fria, a União Soviética tentou esconder do mundo o desastre. A população que vivia próximo à usina ficou um dia inteiro sob os efeitos da radiação sem saber, até que a decisão de evacuar totalmente a cidade fosse tomada. Muitos morreram dias, meses e anos depois, por efeito da radiação. Adultos, crianças, idosos, e até fetos foram contaminados e não conseguiram sobreviver devido a câncer ou má formação. A fauna da região desapareceu e a floresta de pinheiros no entorno ficou vermelha devido aos efeitos radiativos.

Por fim, a notícia do acidente só chegou ao mundo depois que a nuvem de radiação chegou à Suécia, que lá detectou a alta radiatividade e alertou o mundo sobre algum problema ocorrendo na Europa. Já não dava mais para esconder o que havia acontecido na Ucrânia.

Acidente de Chernobyl… ou Pripyat?

Como visitar Chernobyl: A quadra de basquete da cidade fantasma de Pripyat
Quadra de basquete no complexo esportivo de Pripyat

Após a propagação das notícias do desastre, o evento ficou conhecido pelo nome de Chernobyl, que era uma das cidades da região afetada. Mas a usina ficava mais próxima da cidade de Pripyat, onde morava grande parte dos seus trabalhadores e foi o local mais afetado pela radiação.

Pripyat era maior, mais populosa e desenvolvida do que Chernobyl, mas foi esta última que deu nome ao desastre por ser uma cidade de formação mais antiga.

Pripyat havia sido fundada em 1970, apenas 16 anos antes do acidente. Por conta disso a cidade ainda não figurava nos mapas internacionais da época. Perto dela, Chernobyl possuía uma história de cerca de 800 anos, sendo esta usada como referência na hora de apontar o local do acidente.

Pripyat, por sua vez, foi construída para servir como cidade modelo. Era um exemplo de cidade soviética bem sucedida, com uma sociedade voltada para a educação, esportes e hábitos de vida saudáveis. Possuía mais de 49 mil habitantes na época do desastre.

As consequências do desastre

Como visitar Chernobyl: O interior do supermercado
O interior do supermercado em Pripyat

O acidente em Chernobyl pode ser considerado uma das causas diretas para queda da União Soviética, pois a imagem do país ficou desgastada depois dessa catástrofe, numa época em que duas potências disputavam o domínio tecnológico mundial. Mas o motivo principal foi financeiro: muito dinheiro teve que ser realocado de outros setores pelo governo para conduzir o processo de contenção da radiação, limpar a área e construir o enorme sarcófago que engole o reator IV. Ou se tomava esta atitude ou todo o território da Europa corria o risco de ficar inabitável.

Felizmente o pior foi evitado.

Após o acidente, tanto Chernobyl quanto Pripyat e mais uma enorme área que engloba tanto o norte da Ucrânia quanto parte da Bielorrússia passaram a formar uma “zona de exclusão”. Hoje as antigas cidades soviéticas que ali estavam localizadas formam um grande “museu” a céu aberto. São ruínas que contam como era a vida soviética na prática, congeladas no momento em que o reator IV explodiu.

Em Chernobyl, hoje a fauna está voltando ao lugar, com lobos, cavalos selvagens, veados e raposas retornando à zona de exclusão. O turismo, altamente controlado pela Ucrânia, cresce a cada dia mais. Visitar Chernobyl hoje é uma atividade cada vez mais segura e incentivada pelo turismo local.

Como visitar Chernobyl hoje em dia?

Como visitar Chernobyl: Janelas da escola
Janelas na escola em Pripyat

Depois de ler toda a descrição sobre o desastre você deve estar se perguntando “por que diabos alguém ia querer visitar um lugar assim?”! Mas continue lendo, que até o final eu vou ter te convencido de como visitar Chernobyl pode ser uma das melhores experiências em viagens que você terá na vida.

A visita a Chernobyl só pode ser feita através de tours registrados pelo governo da Ucrânia. O controle é altamente rigoroso, tanto na entrada, como na saída. É como se o turista estivesse entrando em outro país, passando inclusive pela imigração. É obrigatória a apresentação do passaporte.

Alguns turistas tentam entrar na zona de exclusão por conta própria, mas é altamente desaconselhado, pois patrulheiros caminham dia e noite pelas ruas de Pripyat para manter a segurança do local.

Como e onde reservar um tour por Chernobyl saindo de Kiev

Como visitar Chernobyl: Uma rua em Pripyat
Uma rua principal em Pripyat

Nós contratamos o tour da Chernobyl Welcome, que possui parceria com o Museu Nacional de Chernobyl, em Kiev. É uma das mais procuradas do mundo para esse tipo de tour e possui escritórios em vários outros países.

Além dela há várias outras empresas, sempre com saídas de Kiev, como a Go2Chernobyl e a Chernobyl Time.

Por conta do rigoroso controle de acesso do governo ucraniano, fazer uma reserva com antecedência é obrigatório para garantir sua visita a Chernobyl. É o passeio mais procurado por quem vai visitar Kiev.

Os tours com a Chernobyl Welcome

Como visitar Chernobyl: Nossa guia Tanya, com uma foto da piscina como era e atrás como está hoje
Nossa guia, Tanya

Preferimos reservar o tour com a Chernobyl Welcome por conta das inúmeras referências positivas que a empresa tem. Apesar de ser um pouco mais caro não queríamos arriscar visitar Chernobyl sem saber com quem estávamos lidando.

De fato, a empresa é bastante organizada e oferece 2 tours diferentes para Chernobyl, sendo o mais famoso deles de 2 dias na zona de exclusão. Infelizmente não pudemos ir nesse tour mais extenso, pois ele só ocorre nas sextas e sábados, o que não batia com nossas datas de viagem pela Ucrânia, mas queremos muito voltar para fazer! Neste caso, os turistas passam a noite em um hotel na zona segura de Chernobyl.

Caso a ideia de dormir na zona de exclusão te preocupe pela presença da radioatividade, tenha certeza que tudo é bastante seguro. A gama de radiação em Chernobyl hoje não é mais tão alta. Durante um tour de 2 dias seria o equivalente a uma sessão normal de raio-X que fazemos regularmente em clínicas e hospitais.

Já o tour que fizemos, o Retro Tour de um dia inteiro, sai todos os dias da semana, só sendo cancelado caso a zona de exclusão esteja em manutenção, mas isso é avisado com antecedência.

No tour estão incluídos:

  • Entrada para a zona de exclusão de Chernobyl e Pripyat
  • Almoço
  • Guia em inglês
  • Seguro de saúde obrigatório (mesmo você já tendo um)
  • Transporte de ida e volta para Kiev com ar condicionado e wi-fi
  • Um contador Geiger-Muller que monitora a radiação local
  • Mapas de Chernobyl e Pripyat
  • Cartões postais
  • Um presente especial
  • Descontos para outros tours da empresa
  • Entrada incluída no Museu Nacional de Chernobyl

Regras para visitar Chernobyl

Como visitar Chernobyl: O interior da escola em Pripyat
Roupas compridas que tapem todo o corpo são obrigatórias

Ao fazer sua reserva, independente da empresa e duração do tour escolhido, serão solicitados os dados de seu passaporte, que são transferidos para o governo da Ucrânia (que é quem de fato autoriza o ingresso dos turistas). Ao chegar à fronteira da zona de exclusão, os soldados terão seu nome e seu número do passaporte em uma lista. Bem rigoroso mesmo, e ótimo para passar confiança também.

No email de confirmação estarão descritas outras regras que devem ser seguidas durante o tour, como:

  • Usar roupas que cubram as pernas e os braços
  • Proibido levar bebidas alcoólicas, comer e fumar na zona de exclusão
  • Proibido tocar em qualquer objeto nas cidades fantasmas
  • Proibido entrar em edifícios que não estejam no programa
  • Proibido usar drones nem apoiar câmeras no chão
  • Proibido levar objetos embora com você (mesmo se tentar, os detectores no final do passeio irão rastrear)
  • Passar por controle de radiação na saída do passeio pelos agentes da zona de exclusão. (Se algum objeto estiver contaminado, terá que passar por um processo de descontaminação ou de destruição. Por isso, não retire nada da zona de exclusão, eles irão saber.)

O que é visto ao visitar Chernobyl atualmente?

Como visitar Chernobyl: Um caderno de caligrafia achado na esola
Um caderno de caligrafia numa carteira da escola de Pripyat

Abaixo listamos o programa básico de um tour de um dia por Chernobyl, mas a ordem da visita pode ser mudada de acordo com as especificações do governo.

Em Chernobyl:

  • Placa de entrada de Chernobyl
  • Beco da Memória e da Esperança e Woodworm Star Memorial
  • Monumento Daqueles que Salvaram o Mundo
  • Sistema de Radares Duga
  • Interior da Estação de Bombeiros
  • Interiores dos Apartamentos em Chernobyl
  • Interior do Jardim de Infância em Zalissya

Na Usina Nuclear:

  • Almoço na Cantina da Usina
  • Sarcófago e Vista Panorâmica da Usina

Em Pripyat:

  • Entrada e Ruas de Pripyat
  • Interior da Piscina Pública Lazurny
  • Interior da Escola
  • Estádio de Futebol
  • Parque de Diversões
  • Restaurante e Supermercado
  • Praça Central de Pripyat, Hotel Polissyia e Palácio de Cultura Energetik
  • Café e antigo Porto no Rio Pripyat

Como é o tour por Chernobyl, saindo de Kiev

Como visitar Chernobyl: As máscaras de gás no chão da escola
Máscaras de gás deixadas para trás por aniquiladores

O tour começa em Kiev, em frente à Estação de Trem Principal da cidade, perto do KFC. Lá, entramos na van e seguimos em direção a Chernobyl. Nossa guia foi a Tanya e ela já estava há um ano trabalhando nesse tour, sem preocupações. Foi muito legal ver a visão do acidente através de sua percepção, pois ela tinha 6 meses de idade quando houve o desastre e pôde nos contar histórias passadas pelos pais dela na época.

A van é equipada com ar condicionado (no dia em que fomos estava muito quente) e com wi-fi, para que os visitantes possam compartilhar fotos em tempo real. São quase 2 horas de estrada até Chernobyl, com uma parada em uma loja de conveniência antes de chegar lá para quem quiser comprar água e snacks. A estrada é muito linda, e passamos por um imenso campo de girassóis pelo caminho.

A zona de exclusão de Chernobyl

Como visitar Chernobyl: A placa de entrada de Chernobyl, em cirílico
A placa de entrada de Chernobyl

Chegando na “fronteira” da zona de exclusão, é preciso passar pelo detector de metais e as bolsas pelo raio-X. Depois, é só aguardar o soldado chamar seu nome e pedir para conferir o passaporte para liberar a entrada.

De lá ingressamos na van novamente e fizemos a primeira parada em frente à placa de entrada da cidade de Chernobyl, escrita em ucraniano.

Monumentos e homenagens

Como visitar Chernobyl: O Beco da Memória e da Esperança, com as placas com os nomes das cidades e vilarejos evacuados durante o desastre. As placas estão fincadas em meio à grama, cercada por árvores.

Da placa de entrada, a próxima parada é o Beco da Memória e da Esperança. Hoje é um descampado, com inúmeras placas com o nome das cidades e vilarejos afetados durante o acidente. Lá é um lugar bastante visitado pelos antigos moradores das cidades, que deixam flores e se encontram para partilhar lembranças.

Como visitar Chernobyl: O Wormwood Star Memorial, uma imensa estátua de metal de um anjo tocando uma trombeta, se referindo a passagem de Apocalipse 8-11 da Bíblia. O céu está muito azul

No final do beco fica uma enorme estátua de um anjo tocando uma trombeta, que se chama, em inglês, Wormwood Star Memorial. Essa estátua é bastante curiosa, pois, algumas pessoas afirmam que o acidente de Chernobyl já havia sido profetizado na Bíblia, mais especificamente em Apocalipse 8-11. O verso da Bíblia diz: E o terceiro anjo tocou a trombeta, e caiu do céu uma grande estrela, ardendo como uma tocha, e caiu sobre a terça parte dos rios e sobre as fontes das águas. E o nome da estrela era Absinto, e a terça parte das águas tornou-se em absinto, e muitos homens morreram das águas, porque se tornaram amargas. Chernobyl, em ucraniano, quer dizer “erva negra” – em inglês Wormwood, nome vulgar da planta a partir da qual é feito o absinto.

Como visitar Chernobyl: O Monumento Daqueles que Salvaram o Mundo, com estátuas dos 6 bombeiros que extinguiram o fogo inicial do reator 4 de Chernobyl.

Entramos de novo na van e seguimos até o edifício do Corpo de Bombeiros de Chernobyl. Lá está em sua entrada uma estátua homenageando os seis bombeiros que deram suas vidas tentando apagar o fogo que queimava no reator 4.

O nome do memorial é Monumento Daqueles que Salvaram o Mundo. Ali, Tanya nos contou sobre a triste história da esposa de um dos bombeiros que, teimou em ver seu marido no hospital, mesmo sendo estritamente proibido. Eles haviam casado há pouco tempo e ela estava grávida, mas não sabia ainda. Seu marido morreu dias depois e ela chegou a dar a luz a uma menina quando deu a hora, mas esta não vingou devido ao altíssimo nível de radiação a qual a mãe recebeu estando em contato com seu pai.

As torres de espionagem soviética

Como visitar Chernobyl: As Torres de Espionagem Duga, altíssimas, no fundo. Uma mulher encostada numa placa indicando radioatividade em primeiro plano.

Seguimos de van por muito tempo dentro de uma vasta floresta de pinheiros. A entrada da estrada é localizada por um ponto de ônibus com desenhos infantis, que os soviéticos fizeram para indicar que ali era um campo de colônia de férias, mas na verdade era só para despistar as enormes torres de espionagem que foram construídas em meio à floresta.

Como visitar Chernobyl: Tarzan, o cachorro de Chernobyl, olhando para a câmera em frente a nossa van.
Tarzan, o cachorro de Chernobyl

No caminho até as torres fomos recebidos por Tarzan, o primeiro animal que vimos na zona da exclusão, um cachorro vira-lata muito simpático. De início todos ficamos apreensivos de tocar nele, com medo dele ser radioativo, mas Tanya nos disse que os animais que hoje nascem na zona de Chernobyl são tão saudáveis quanto os do mundo exterior.

O Sistema de Radares Duga é formado por colossais torres de espionagem da época da Guerra Fria. É um complexo de torres gigantescas que captavam mensagens de satélites e rádio. Algumas pessoas desobedecem às ordens e sobem até o topo das torres para tirar fotos lá de cima, mas é altamente desaconselhável, em via que as estruturas estão bem danificadas devido a anos de desuso.

Os edifícios de Chernobyl

Como visitar Chernobyl: A vista externa de dentro de um dos apartamentos em Chernobyl.
Vista de um dos apartamentos em Chernobyl

Após nossa ida às torres, seguimos até o antigo prédio do Corpo de Bombeiros de Chernobyl, tomado pelas plantas. Podemos ver nas paredes os horários dos funcionários, salas, banheiros e um antigo salão com pinturas feitas pelos bombeiros na parede.

Como visitar Chernobyl: Uma mulher está parada dentro de um apartamento em Chernobyl, com a parede atrás totalmente descascada.
Como visitar Chernobyl: A cozinha de um apartamento em Chernobyl, com suas paredes azuis, fogão e pia, com uma varanda

De lá, seguimos até um complexo de apartamentos em Chernobyl, um dos pontos altos do tour. Podemos entrar em cada um dos apartamentos em um prédio abandonado na cidade, tomado pelo tempo e pela natureza. Subimos as escadas até o quinto andar, entramos em cada um dos lugares, ainda com números nas portas, papéis de parede descascados, banheiros com azulejos, alguns sapatos, varandas que hoje dão para a vasta floresta e um lindo piano que ainda funciona. Incrível poder ver um apartamento tão atual naquela forma tão degradada. O prédio é um parque de diversões para quem gosta de lugares abandonados.

Como visitar Chernobyl: o interior do Jardim de Infância cheio de beliches e com algumas bonecas
Como visitar Chernobyl: Um sapatinho de criança

Após passar um tempo explorando os apartamentos, vamos até o prédio do Jardim de Infância do vilarejo de Zalissya, que é um dos momentos mais impactantes da viagem. Na frente da escolinha, nossa guia aciona o medidor de radiação, e ele dá uma disparada, mostrando que o solo ali ainda estava contaminado. Mas são pouquíssimos pontos no tour onde isto ocorre atualmente.

Dentro do jardim de infância encontramos desenhos infantis, muitas bonecas, sapatinhos e salas repletas de caminhas e beliches onde ficavam as crianças durante a tarde.

A Usina de Chernobyl e o Sarcófago do reator 4

Como visitar Chernobyl: O medidor de radioatividade em frente ao Sarcófago onde está selado o reator 4
O medidor de radiação com o sarcófago atrás

Logo após essas visitas, seguimos até o centro de Chernobyl, onde algumas pessoas ainda moram. Paramos em frente ao Rio Pripyat, de onde podemos ver o Sarcófago onde fica o reator 4, hoje selado, que explodiu no acidente. Lá, na beira do rio, vemos uma raposa super simpática, que já conhece os guias e sabe que ali receberá comida. Depois de alimentada, ela some na floresta no entorno, e é a nossa hora de almoçar.

Como visitar Chernobyl: Uma raposa na zona de exclusão de olhinhos fechados curtindo o sol na grama
Como visitar Chernobyl: O almoço na Usina de Chernobyl, com três tipos de pratos diferentes, sopa, peixe com arroz e salada. Dois tipos de suco

O almoço do tour é feito na Cantina da Usina de Chernobyl, onde precisamos passar pelo controle de radiação antes de entrar no recinto. A comida é tradicional ucraniana, simples, mas bem farta, com direito a sopa russa, arroz com peixe, salada, dois sucos e pão. Lá também ficam os banheiros, para quem precisar usar.

Como visitar Chernobyl: O Sarcófago onde está selado o reator 4, com um monumento em sua frente

De lá seguimos até a área em frente ao famoso reator 4, oficialmente chamado de V.I. Lenin IV, que explodiu e causou o maior desastre nuclear da história. É uma parada imperdível para quem quer visitar Chernobyl.

À nossa frente fica o grandioso Sarcófago, que guarda em seu interior os restos do reator, selando sua radiação em várias camadas de metal e cimento, evitando que vaze. A instalação é a maior construção contínua do mundo, e continuará crescendo para que qualquer problema seja evitado no futuro. Muitas pessoas ainda trabalham ali, para manter a proteção do local. Os outros reatores, quatro no total, continuaram em funcionamento até 2000, quando foram desativados definitivamente.

Existem alguns tours que ingressam em um dos reatores, podendo ver como funcionavam na época, com os enormes painéis de controle, tudo fiscalizado, claro.

Depois de ver o malfadado reator 4, seguimos para a cidade fantasma de Pripyat, a que mais sofreu durante o acidente de Chernobyl e o local mais incrível e aterrador de todo o passeio.

A cidade modelo de Pripyat

Como visitar Chernobyl: Uma máscara de gás pendurada em uma placa de rua em Pripyat
Nas ruas de Pripyat…

Pripyat foi uma cidade erguida para ser modelo da modernidade na sociedade soviética, com prédios de design sucinto, mas ainda assim, muito modernos. Parece até ironia do destino, mas não existe lugar melhor para entender como era a vida soviética do que Pripyat. Ali estão os últimos registros de uma cidade que nasceu na União Soviética, e que desapareceu ainda antes de sua queda.

Diferente de outras cidades russas e ucranianas, que possuem grande influência do império antes da Revolução Russa, Pripyat apresenta tudo que o regime socialista pregava na URSS. Ali vivia uma sociedade muito bem organizada, proativa, focada em esportes e com uma vida bastante regrada.

Como visitar Chernobyl: A placa de entrada de Pripyat, escrito em cirílico, com a data de fundação:1970
Como visitar Chernobyl: As ruas antes e depois em Chernobyl, com nossa guia mostrando como era no passado através de uma fotografia

Paramos na placa de entrada de Pripyat, onde tiramos uma foto em grupo. Logo depois caminhamos por suas ruas, irreconhecíveis, tomadas pela mata. Tanya nos mostra fotos do local exatamente onde foram tiradas na década de 1980. E aos poucos a cidade vai tomando forma em nossas mentes. A estradinha de cimento cercada de grama se torna rua, com faixa de pedestres. Um semáforo aparece ali, enferrujado em meio às árvores. Podemos imaginar carros e motos passando por meio a nós. Uma experiência única, como se víssemos um filme de viagem de dentro de uma máquina do tempo.

Os “cartões-postais” de Pripyat

Como visitar Chernobyl: A Piscina Pública Lazurny, abandonada

Uma vez em Pripyat, seguimos aos pontos que acredito que sejam os mais esperados pelos visitantes, que se tornaram verdadeiros (e tristes) cartões postais:

A Piscina Pública Lazurny, que ficava dentro de um complexo esportivo com academia e quadras de basquete. Enorme e vazia, é arrepiante. Seus azulejos estão descascados e pichados, seu fundo está repleto de objetos jogados ali durante os anos. O trampolim ainda se ergue do chão. No fundo, um relógio que marca exatamente a hora em que o reator explodiu. É uma vivência que vai além de fotos. É como se estivéssemos visualizando o destino da Terra na nossa frente.

Como visitar Chernobyl: Os corredores da escola
Como visitar Chernobyl: Um mar de livros

Continuamos caminhando pelas ruas que não parecem mais ruas, até chegar na Escola. A entrada lembra o chão da casa de nossas avós. Sabe aquelas calçadas com azulejos picadinhos em cor marrom? Então, assim são as paredes externas do colégio. Conforme você vai entrando, novas reações vão surgindo. Janelas abertas, salas com carteiras cobertas de poeira, o refeitório repleto de máscaras de gás deixadas para trás pelos aniquiladores (profissionais que foram responsáveis durante as décadas seguintes ao desastre por descontaminar o ambiente).

Mas o mais impactante talvez seja perceber que em vários momentos você estará caminhando sobre um mar de livros. Livros infantis, livros com rosto de Lênin, cadernos de caligrafia, com correções da professora.

Como visitar Chernobyl: A roda gigante com um carrinho bate-bate em sua frente
Como visitar Chernobyl: A área dos carrinhos bate-bate

Saindo da escola, passamos pelo estádio de futebol, do qual hoje só restaram as arquibancadas e seguimos em direção ao maior cartão postal da cidade fantasma de Pripyat: o Parque de Diversões.

Este parque nunca chegou a ser inaugurado oficialmente, pois teria sua abertura feita nas celebrações de 1 de maio, dia do trabalhador, mas o reator de Chernobyl explodiu 5 dias antes. Ele nunca chegou a receber seus visitantes, mas lá está a famosa roda gigante e a área dos carrinhos bate-bate amarelos, abandonados.

Outros edifícios em Pripyat

Como visitar Chernobyl: O Hotel Polissiya na Praça de Lênin, em Pripyat
O Hotel Polissiya na Praça Principal

Seguindo pelas ruas de Pripyat, passamos pelo restaurante, onde ocorria um casamento enquanto o reator pegava fogo e pelo supermercado, este totalmente revirado, com suas alas ainda simbolizadas em cirílico, carrinhos de compras espalhados aqui e ali.

Mais uns metros adiante e estamos na Praça Principal de Pripyat, a Praça de Lênin, enorme, como toda praça da era comunista, em art decó, com colunatas na frente do Hotel Polissiya, que recebia as maiores autoridades quando iam visitar a cidade. Ao lado do hotel fica o Palácio de Cultura Energetik, que contava com cinemas, salas de exposições, sendo um grande centro cultural da cidade.

Como visitar Chernobyl: O antigo porto no Rio Pripyat, com o rio ao fundo

Por último, seguimos até o antigo Porto de Pripyat, nas margens do Rio Pripyat, atrás do famoso café da cidade. É estritamente proibido entrar no café, pois é um dos locais mais contaminados da cidade. A nossa guia, mais uma vez, pega o medidor de radiação e o coloca perto do solo no porto, e ele dispara como nunca antes. A área do porto foi a que recebeu os maiores índices de radiação, pois o vento soprou diretamente para lá, contaminando bastante o lugar.

O retorno ao mundo real

Como visitar Chernobyl: uma mulher passando pelo controle de radiação
Eu sendo monitorada no controle de radiação

Ao fim da visita, passamos novamente para a “fronteira” da zona de exclusão de Chernobyl, onde temos que entrar em uma máquina de controle de radioatividade para ver se está tudo ok antes de voltarmos ao mundo real. Enquanto estamos sendo monitorados nas salas pelos soldados, outros fiscalizam dentro das vans para ver se ninguém está retirando algo da zona excluída, o que é proibido. Retornamos para nossa van e voltamos a Kiev.

Para quem faz o tour com a Chernobyl Welcome, no meio do caminho de volta recebe alguns cartões postais de Pripyat e a surpresa prometida. Não vou falar porque… é uma surpresa!

Depois de chegarmos ao mesmo ponto de encontro lá do início, ainda voltamos de metrô com nossa guia, que nos explicou mais sobre a cidade e quis entender nossa forma de viajar e trabalhar.

Visitar Chernobyl vale a pena no final das contas?

Como visitar Chernobyl: uma mulher com um cachorro
Tarzan e eu. A vida em Chernobyl segue a passos curtos

Chernobyl é um lugar único do mundo. Uma visita que nos emocionou como poucas nesses anos de viagem. É incrível poder caminhar por uma cidade inteiramente vazia e ver como seria o mundo sem a presença de humanos. Mas ao mesmo tempo é assustador perceber o quanto o ser humano pode ser perigoso para nós mesmos e para nosso planeta.

Chernobyl hoje é um lugar vazio. São carcaças de cidades que um dia foram brilhantes. Ali, o silêncio impera. A gente consegue perceber ali que não temos certeza de nada e que a vida é muito frágil. Visitar Chernobyl é triste, mas ao mesmo tempo abre nossos olhos. A gente dá ainda mais valor à vida que temos, e percebemos simultaneamente como somos falhos. O ser humano é o animal mais inteligente da Terra, mas podemos ser os mais estúpidos também.

Visitar Chernobyl não tem nada de mórbido, muito pelo contrário. Ali é história viva, para não deixar esquecer. Aqueles prédios, tomados hoje pela mata, estão ali para nos dar uma lição. Para nos importarmos com o planeta, para nos importarmos com a natureza. A história nem sempre é bonita ou feliz. O importante, no final de tudo, é como levamos aquilo pra vida. Visitar Chernobyl não é diferente de visitar Roma, ou Paris. É uma aula de história que nos conta sobre a evolução humana. Se pensarmos em todos os lugares turísticos construídos em cima de dor, não visitaríamos nada. O Coliseu foi construído para matar humanos. Na praça em frente à Notre Dame muitos foram queimados acusados de feitiçaria. Nenhum lugar está imune. As ruínas de Chernobyl são tão nobres quanto às do Fórum Romano, e nos ensinam tanto quanto.

Mas, de todas as ruínas já visitadas, nenhuma nos impactou tanto quanto as de Chernobyl. Pripyat é contemporânea demais para não se deixar abalar. O acidente aconteceu na década de 1980, praticamente ontem. É impossível entrar em seus prédios e não imaginar uma família ali morando. Ou em um supermercado sem pensar em tantas pessoas empurrando seus carrinhos de compras. Ou no parque de diversões, com tantas crianças se divertindo. É tudo real demais.

Uma viagem no tempo palpável demais para nós humanos. Pode ser dolorido, mas super válido. E a vontade de voltar lá aumenta a cada foto revista, a cada texto escrito e lido e a cada vídeo assistido. Nós voltaremos lá, pode ter certeza.

Infográfico: Como visitar Chernobyl hoje em dia

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Sobre o Autor

Larissa Pereira

Escritora de viagens, fotógrafa e graduada em história da arte, Larissa equilibra com maestria suas muitas paixões. Seus artigos exibem uma perspectiva histórica e cultural em suas narrativas de viagem, transformando cada destino em uma tela rica em detalhes e curiosidades.

Como fotógrafa, Larissa utiliza sua lente para registrar todos os momentos do blog, traduzindo a beleza de cada local em histórias visuais. Seu olhar para detalhes aprimora a experiência, permitindo que os leitores embarquem virtualmente em suas viagens.

Larissa é também a apresentadora do canal do Vida Cigana no YouTube, onde compartilha dicas e explica atrações em detalhes, desenvolvendo itinerários e inspirando outros a vivenciarem suas próprias jornadas.

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